Os números do recentíssimo Anuário Brasileiro de Segurança Pública
são alarmantes: 70% dos brasileiros dizem não confiar na Polícia e pelo
menos cinco pessoas morrem todos os dias vítimas da instituição que
deveria protegê-las. A quantidade de mortos em intervenções policiais é
quase cinco vezes maior que a registrada nos Estados Unidos. Tal
diagnóstico esquentou ainda mais um debate que ganhou força após os
protestos de junho: afinal, é mesmo este o modelo de Polícia que
queremos?
Embora construída para recuperar e garantir direitos civis, a
Constituição de 1988 manteve a Polícia Militar como braço das Forças
Armadas, que atuam em situações de guerra e encaram seus alvos como
inimigos a serem derrotados. Para os críticos ao atual sistema de
segurança pública, a ligação com o Exército seria a origem do suposto
caráter violento da PM.
“Não cabe na democracia uma polícia que não está aí para proteger as
pessoas, mas para combater o inimigo. Para se ter ideia, o juramento da
PM jura obediência à hierarquia, e não o respeito à lei, que deveria
estar acima de tudo”, defendeu Givanildo da Silva, líder do movimento
nacional pela desmilitarização da PM, com nove comitês no País e
perspectiva de ampliação para 18 até o fim do ano.
Com base nessa tese, pelo menos três propostas de emenda à
Constituição (PEC) tramitam no Congresso Nacional para mudar a parte da
lei que vincula a PM às Forças Armadas – uma delas de autoria do
deputado federal Chico Lopes (PCdoB-CE), que autorizas os governos dos
estados a desmilitarizarem a PM e a unificarem suas polícias.
Mas, o assunto está longe do consenso. “A hierarquia militar ainda é
importante. Pôr fim a ela é aumentar o descontrole e até piorar a
violação de direitos humanos. Corre-se o risco de perder controle total
da instituição, de dar uma sensação de ‘liberou geral”, avalia o
ex-secretário da Guarda Municipal de Fortaleza, Arimá Rocha, considerado
responsável pelo suposto processo de “militarização” do perfil da
Guarda.
O espelho civil
Vale ponderar que, se o parâmetro para a desmilitarização for a
atuação das polícias civis, corre-se o risco de dar com os burros
n’água. Práticas de tortura, violação de direitos e abuso de poder são
chagas que atingem também as delegacias e seus agentes desfardados. No
Ceará, a situação é grave. Hoje, do total de investigações que em
andamento na Controladoria Geral de Disciplina dos órgãos de Segurança,
cerca de 30% são contra policiais civis.
Por quê
ENTENDA A NOTÍCIA
A reação policial às manifestações deste ano virou prato cheio para a
defesa de mudanças no sistema. Antes, em 2012, a Dinamarca chegou a
recomendar, em reunião da ONU, que o Brasil extinguisse a Polícia
Militar.
Fonte: O Povo
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